segunda-feira, setembro 25, 2006

Transamerica

This picture is hosted by ImageShackFinalmente pude assistir a Transamerica no cinema. O filme demorou um bocado para chegar às salas de BH, mesmo tendo rendido a Felicity Huffman um Golden Globe, um Independent Spirit, o prêmio principal de Tribeca e mais uma estante de outros, além de dúzias de indicações como melhor atriz, inclusive ao Oscar. De 2005, é bom dizer!

Huffman é certamente mais conhecida por seu atual papel na popularíssima série Desperate Housewives, como a working mom Lynette Scavo. Desde os primeiros capítulos da série, ela já se mostrava de longe a melhor atriz em cena, o que se comprovou ao longo das duas temporadas até o momento, em cenas como a sutil crise de ciúme de uma brincadeira entre seu marido e a fogosa Gaby, o ataque histérico provocado por seus filhos, a descoberta do caso de sua chefe ou a já famosa dança no balcão do bar, entre outras.

A interpretação da atriz para o transexual Sabrina 'Bree' Osbourne em Transamerica é o que rende ao filme uma classificação como "mediano, porém memorável". Parece algo contraditório, sem dúvida, mas, enquanto o filme como um todo não chega a ser assim tão entusiasmante, a atuação de Huffman é algo nada menos que indescritível. Isso não parte de alguma apelação fácil ou história lacrimosa.This picture is hosted by ImageShack Ao contrário, a trama tem uma levada simples (nem sempre de temática muito fácil), e a maior parte dos méritos vem exatamente de certa contenção que a atriz confere a Bree, uma personagem difícil que seria "arrastada" de forma miserável por centenas de outras atrizes mais conhecidas e menos capacitadas. O que comove é a perfeição com que Felicity Huffman executa seu trabalho no papel de uma vida, numa daquelas atuações que sempre esperamos e dificilmente constatamos em qualquer área profissional. Estamos frente a um daqueles raros casos em que nem se deve discutir o Oscar a que ela concorria. Tanto faz. Quem assiste ao filme sabe a quê nós nos referimos.

Muita gente poderia considerar Transamerica um grande filme por conta disso, mas recairia numa confusão entre o filme em si e sua protagonista. Confusão justificável, claro, já que Bree praticamente é o filme. Mas a história - pouca, simples e eficaz no que pretende - não é lá das mais geniais ou originais. Nunca chega a ser notavelmente bem-escrita ou tão importante quanto aqueles que a vivenciam, num típico caso de filme-veículo em que Huffman é quem confere vida, coesão e credibilidade àquela sucessão banal, em forma de dignidade e de uma autenticidade extraordinária, o completo oposto de uma caricatura.

This picture is hosted by ImageShackOutros personagens, em especial o do rapazinho Kevin Zegers (escreva: esse nome ainda vai aparecer um bocado!), servem muito bem ao propósito de deixar Bree conduzir a dança. Também as locações e a direção aparecem com serenidade, sem sobressair ou comprometer. Já o figurino e a maquiagem certamente dão uma força imensa na composição de Bree como alguém muito natural e confortável com sua identidade, a não ser pelo forte incômodo anatômico que norteia sua história e que o leitor, sem esforço, imagina qual seja. Bree já providenciou solução para esse seu incômodo, mas não contava com alguns detalhes imprevistos que a vida teimou em trazer.

Quem põe a mesa é o também genial ator William H. Macy, desta vez fora de cena e "apenas" um produtor-executivo que sabia exatamente o que exigir do pessoal envolvido. "A primeira impressão que temos de Bree é chocante, porque ela é muito estranha e repulsiva", diz Macy. "No fim do filme, ainda que a maquiagem seja a mesma, você passou a adorar aquela mulher".

Ele e Felicity Huffman se conhecem há mais de duas décadas, casaram-se em 1997 e já têm duas filhas. Mas ainda aparecem em público com manifestações sinceras de carinho e formam um dos casais mais simpáticos e competentes do showbiz, daqueles que não precisam de beleza aviltante, badalação em festinha ou publicidade duvidosa em tablóides. Ambos salvam a delicada história de Bree de um destino fraco, e assim comprovam que saber do seu ofício é muito mais do que apenas pôr carinha bonitinha na tela.

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